Uma corte do Catar ordenou nesta quarta-feira (6) a libertação de um casal americano que estava preso sob a acusação de ter matado de fome sua filha adotiva de 8 anos e vendido partes de sue corpo, informaram fontes judiciais.
Durante a audiência o casal negou a acusação de ter deixado sua filha sem comida. A corte ordenou a libertação dos dois, mas ambos estão proibidos de deixar o país.
A menina havia sido adotada em um orfanato em Gana e morreu em 15 de janeiro.
Segundo uma página na internet criada para defender o casal, a criança sofria desordens de alimentação, provavelmente, decorrentes da pobreza na qual viveu no início de sua vida.
O casal tem outros dois filhos adotados, que foram morar nos Estados Unidos com parentes.
A próxima audiência do caso será realizada em 3 de dezembro.
Matthew e Grace Huang, um casal americano com três filhos adotivos da África, viveram no reino do Catar desde julho de 2012.
Na maior parte do tempo, desde então, estão presos no país, acusados de matar a filha de fome com intenção de vender os órgãos da criança de 8 anos de idade.
As autoridades do Catar negaram, repetidas vezes, os pedidos de fiança do casal, e somente nas últimas semanas permitiram que a mãe de Grace levasse as duas crianças sobreviventes, dois meninos, à sua casa nos Estados Unidos.
Em todas as audiências preliminares, os advogados de defesa, que garantiram sua inocência, não obtiveram permissão de apresentar seu lado da história para o juiz que preside o caso.
Nesta quarta-feira (6), eles devem ter essa oportunidade.
Não há dúvidas de que a filha do casal, Glória, morreu em 15 de janeiro após não se alimentar por dias. Mas Matthew, Grace e seus apoiadores afirmam que a garota tinha um transtorno alimentar ignorado pela acusação. Eles decreveram o caso como uma combinação escandalosa de evidências falhas ou inexistentes, preconceito étnico e desencontros culturais extremos em um país onde famílias multirraciais são uma anomalia e a adoção uma prática estranha.
Investigadores da polícia de Catar, em relatório sobre a morte de Glória, acham as circunstâncias da família como altamente suspeitas, e escreveram que a garota teria sido forçada a passar fome. Os réus, concluiu a investigação, “tinham participação no tráfico de crianças, muito provavelmente para vender seus órgãos ou realizar experiências médicas com eles”.
As três crianças eram educadas em casa pela sua mãe, em vez de frequentar uma escola.
Questionado em uma audiência preliminar, em fevereiro, sobre quais provas teria para afirmar a acusação de tráfico de crianças, um investigador respondeu que “o processo de adoção consiste em buscar crianças que tenham boa aparência e se comportem bem, e que tenham características hereditárias semelhantes a de seus pais”, segundo a transcrição traduzida do árabe.
“Mas as crianças ligadas a esse incidente são todas da África e suas famílias indigentes.”
O caso levantou questionamentos sobre o sistema judiciário do Catar, um aliado próximo aos Estados Unidos, que aspira à posição de uma sociedade islâmica moderna e tolerante e se tornou o primeiro país árabe a ser escolhido para sediar uma Copa do Mundo, em 2022.
Autoridades consulares da embaixada dos Estados Unidos também questionaram, repetidamente, sobre o andamento do caso, segundo uma autoridade do Departamento de Estado, o que se configura, aparentemente, como uma adicional fonte de pressão ao país.
“A acusação tem apresentado suas evidências sem nenhuma participação nossa”, disse Alex Simpson, um advogado da equipe de defesa do casal Huang, que é de Los Angeles. “Você tem essas pessoas que estão na cadeia há quase um ano com base em coisas que eles não tiveram acesso – de onde veio isso? Vamos explicar no tribunal nosso lado dessa história pela primeira vez.”
Foi a Copa do Mundo que levou o casal Huang e seus filhos ao Catar em 2012. Matthew, um engenheiro, foi convidado a trabalhar em um projeto grande de infraestrutura para preparar o país para o torneio de futebol.
A defesa afirma que Matthew Huang, 37 anos, e Grace Huang, 36, tentaram resolver o grave transtorno alimentar de Glória, que passou fome durante boa parte de sua infância em Gana.
Eles afirmaram que a menina, às vezes, ficava dias sem comida, e apresentava compulsão por junk food ou vasculhava o lixo, ou roubava comida para comer escondida em seu quarto.
De acordo com especialistas em adoção dos Estados Unidos, esses distúrbios não são incomuns entre filhos adotivos de países carentes.
Eric Volz, diretor da Agência David House, disse estar “perplexo sobre por que o Catar deixaria o caso chegar tão longe” e salientou que a embaixadora dos Estados Unidos, no Catar, Susan Ziadeh, tem sido “atenciosa e prestativa”.